A sessão mais recente da Câmara de Vereadores de Dias d’Ávila expôs a fragilidade do Legislativo diante do Executivo. O vereador Thiago Lima (do Boxe), do PL, apresentou requerimento para convocar o secretário de Habitação, Deivisson Couto, a fim de esclarecer as denúncias sobre irregularidades no programa Minha Casa Minha Vida – Residencial Concórdia I, mas o pedido foi retirado de pauta por decisão de Thiago Saraiva (União Brasil), aliado do prefeito.
O clima foi tenso. Lima questionou por que o requerimento não havia sido apreciado, mas ouviu de Saraiva que “não tinha que dar explicação” e que não via necessidade de expor o secretário, tirando-o de seus afazeres. A blindagem dividiu o plenário e reforçou a percepção de que a base governista prefere proteger a gestão a garantir a fiscalização.
O caso se soma a outras denúncias já reveladas pelo É Notícias e ignoradas pelos vereadores. Um contrato de R$ 1.996.000,00, celebrado por dispensa de licitação entre a Prefeitura e a empresa Recycle Waste Energy Tratamento de Resíduos Ltda., transfere para a própria contratada a responsabilidade de emitir os comprovantes de execução do serviço. Na prática, a empresa se autofiscaliza e define quanto deve receber, modelo classificado por especialistas como “conflito de interesses insustentável”.
Outra apuração aponta suspeitas de desvio de recursos da Lei Paulo Gustavo. Segundo documentos obtidos pelo É Notícias e informações investigadas pelo Ministério Público da Bahia, parte dos R$ 101 mil repassados para um projeto de cinema itinerante pode ter sido movimentada de forma irregular, envolvendo o servidor Edilson Santos dos Santos, conhecido como “Pitter”, e o ex-secretário de Cultura e atual secretário de Esportes, Marcos Antônio Pereira Mendonça, o “Marquinhos”. Áudios, mensagens e documentos obtidos pela reportagem indicam possível manipulação de recursos e até tentativa de obstrução de justiça.
Apesar da gravidade dos fatos, a Câmara não promoveu nenhuma audiência pública nem abriu comissões de apuração para discutir os contratos ou os repasses investigados. Para um especialista ouvido pela reportagem, esse comportamento é sintomático:
“O episódio em Dias d’Ávila reflete um problema recorrente em câmaras municipais de todo o país: a submissão do Legislativo ao Executivo. Muitos vereadores deixam de lado o papel de fiscalização para preservar benefícios, cargos e emendas”, avaliou.
Enquanto isso, a Prefeitura segue sem responder aos questionamentos do É Notícias sobre o contrato da Recycle Waste e sobre as denúncias ligadas à Secretaria de Cultura. Já em relação ao Minha Casa Minha Vida, o secretário de Habitação garantiu que servidores fora da faixa de renda foram excluídos da lista de pré-selecionados, mas a polêmica ainda não foi esclarecida de forma pública e oficial.
A ausência de postura da Câmara reforça a fragilidade da fiscalização municipal em Dias d’Ávila e levanta dúvidas sobre a prioridade dos vereadores: se é a defesa da população ou a manutenção da aliança política com o Executivo.