
A juíza Marina Lemos de Oliveira Ferrari, titular da Vara Criminal de Dias d’Ávila, descreveu em decisão oficial que, segundo a petição inicial, o áudio atribuído ao presidente da Câmara de Vereadores, José Morais de Almeida Júnior, conteria “expressões ofensivas de cunho racial”. A afirmação consta no relatório da decisão proferida em 9 de outubro de 2025, quando a magistrada analisou os fatos apresentados por Siranedes Eleutério, conhecido como Leo Mineiro, responsável por levar o caso à Justiça.
No documento, ao sintetizar o conteúdo juntado aos autos, a magistrada registrou que, conforme narra o querelante, o presidente da Câmara teria divulgado um áudio contendo “expressões ofensivas de cunho racial e difamatório, como ‘NEGO VELHO FEDORENTO’ e ‘NEGO SEM VERGONHA’”. As expressões aparecem transcritas diretamente na decisão, dentro da parte destinada ao relato do que foi alegado na queixa-crime.
Embora não tenha analisado o mérito das falas, a juíza destacou que os delitos noticiados — racismo e abuso de autoridade — são crimes de ação penal pública incondicionada. Por isso, determinou o envio do caso ao Ministério Público da Bahia (MP-BA), para que o órgão examine o material apresentado e avalie a adoção de medidas investigativas.
O episódio também chegou ao Ministério Público Federal (MPF). Em 10 de novembro de 2025, a Procuradoria da República na Bahia autuou a Notícia de Fato nº 1.14.000.002259/2025-19, classificada na área temática de intolerância e injúria racial. Após análise preliminar, o procedimento foi remetido à esfera estadual, indicando que o caso gerou repercussão institucional em mais de um órgão ministerial.
Paralelamente, o caso provocou movimentações políticas na cidade. O presidente da Câmara, José Morais, tem tentado minimizar a gravidade das acusações ao afirmar, em conversas internas e manifestações públicas, que o episódio seria apenas um “caso familiar” — tese que não encontra respaldo no teor da decisão judicial nem na natureza dos crimes apontados. A mesma narrativa tem sido adotada pelo vereador Cleiton Lima (PV), interpretada por integrantes da cena política como tentativa de suavizar a pressão sobre o presidente da Casa.
Além disso, Cleiton Lima é o autor da proposta que concedeu o Título de Cidadão Diasdavilense ao promotor Fernando Gaburri de Souza Lima, titular da 4ª Promotoria de Justiça de Dias d’Ávila. A homenagem, aprovada pela Câmara e marcada para 25 de novembro de 2025, destaca a atuação do promotor desde 2020 em áreas como saúde, fiscalização de serviços públicos e proteção de grupos vulneráveis. O procurador da prefeitura, Dr. Roberto Oliveira Araújo, também elogiou publicamente o promotor ao comentar a honraria.
A crescente repercussão do caso, somada à tentativa de classificá-lo como questão restrita ao âmbito familiar, gerou debate entre moradores de Dias d’Ávila. Em mensagem enviada ao É Notícias, um leitor alertou que, embora não exista impedimento legal, conceder honrarias a autoridades em atividade na comarca pode levantar questionamentos éticos. Segundo ele:
“A concessão de um título de cidadão honorífico a um promotor em atividade pode gerar a percepção de conflito de interesses ou comprometimento da imparcialidade. A sugestão é conceder tais honrarias apenas após a saída da autoridade da comarca, para evitar questionamentos éticos.”
A manifestação reflete a preocupação de parte da comunidade sobre o ambiente institucional da cidade, no momento em que o caso envolvendo o presidente da Câmara segue para avaliação do Ministério Público.