
A Prefeitura de Dias d’Ávila publicou, no Diário Oficial de 27 de novembro, a Lei nº 810/2025, que reestrutura os cargos em comissão e as funções de confiança da Administração Direta, redefine atribuições e substitui os anexos I e II da Lei nº 330/2009. A nova norma, apresentada como resposta à decisão do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) que declarou inconstitucionais cargos comissionados criados em 2009, recria 543 cargos em comissão distribuídos por diversas secretarias.
A Câmara Municipal aprovou a lei com o apoio da base governista. Entre os vereadores que votaram a favor está Cleiton Lima (PV), que recentemente adotou um discurso cada vez mais alinhado à administração municipal. Em entrevista à imprensa local, o vereador já havia antecipado que votaria pela manutenção dos cargos comissionados, declarando: “O projeto já chegou à Câmara, será votado e aprovado, e os cargos vão se manter.”
A fala, que minimizou a decisão do TJ-BA e enfraqueceu críticas da sociedade civil, agora se confirma com sua adesão ao projeto que recria centenas de cargos — muitos deles com atribuições vagas e potencialmente inconstitucionais.

A aprovação ocorre também em meio ao desgaste político enfrentado por Cleiton Lima, que foi um dos principais opositores do prefeito durante boa parte do mandato. A mudança de postura, segundo fontes do É Notícias ligadas à gestão municipal, ocorreu após a nomeação de familiares do vereador em cargos da Prefeitura.
Apesar disso, Cleiton não é o único vereador em situação semelhante. Fontes do É Notícias ligadas à gestão municipal afirmam que outros parlamentares da base governista também têm familiares nomeados em cargos comissionados, o que, na avaliação desses interlocutores, ajuda a explicar o apoio consistente da base à Lei nº 810/2025, que amplia justamente a estrutura responsável por abrigar essas nomeações.
A lei fixa a remuneração dos cargos em comissão conforme a tabela do Anexo II, com salários que variam de R$ 1.518,00 (casos como Assessor A, Assessor de Gabinete e diversos encarregados) a R$ 3.627,05 (casos como Superintendente e Subsecretário Municipal).
Tabela oficial de cargos e remunerações anexada à Lei nº 810/2025, aprovada pela Câmara Municipal.
A análise do quadro mostra que a maior parte das vagas está concentrada nas faixas salariais mais baixas, justamente aquelas com atribuições amplas e genéricas. Funções como Assessor A, Assessor de Gabinete, Oficial de Gabinete, Supervisor de Vigilância e diversos “Encarregados” recebem R$ 1.518,00, mas, na prática, não apresentam descrição detalhada de responsabilidades no anexo quantitativo — um dos pontos centrais levantados anteriormente pelo TJ-BA ao derrubar a lei de 2009.
A tabela também inclui cargos com remuneração mais elevada, como Superintendente, Subsecretário Municipal, Diretores e Coordenadores de grandes eventos. Segundo análises feitas por especialistas consultados por órgãos de controle, muitos desses cargos possuem funções que se sobrepõem entre si ou desempenham atividades que não justificam provimento comissionado.
A nova lei repete um problema antigo: cargos diferentes exercendo funções praticamente idênticas. Entre os casos mais evidentes estão:
Assessor A, Assessor B e Assessor Especial
Gerente, Coordenador e Oficial de Gabinete
Diversos cargos de “Chefe” com diferenças apenas nominais
Essa repetição — apontada em avaliações técnicas de controle interno e externo — gera inflamento artificial da máquina administrativa. Na prática, cria espaço para nomeações políticas sem controle técnico sobre as atribuições.
Outro ponto de preocupação é a criação de cargos com perfil claramente técnico, como:
Assessor Técnico Jurídico
Assessor Jurídico
Encarregado de Limpeza Pública
Encarregado de Fiscalização
Encarregado de Ações de Saúde
Encarregado Administrativo
Embora o artigo 2º da lei afirme que cargos comissionados não podem ser usados para funções “meramente técnicas, burocráticas ou operacionais”, a própria estrutura aprovada mantém funções que, em tese, deveriam ser preenchidas por servidores efetivos mediante concurso.
Para especialistas ouvidos pela reportagem, a presença desses cargos pode indicar uma tentativa de acomodar funções típicas de carreira dentro de estruturas políticas, contrariando o espírito das decisões do Supremo Tribunal Federal sobre o tema.
A Lei nº 810/2025 não apresenta, no texto principal divulgado no Diário Oficial, estudo de impacto financeiro nem detalhamento do custo global da nova estrutura. Caso exista como anexo interno, o documento não foi disponibilizado junto à publicação.
Com 543 cargos em comissão distribuídos em diferentes faixas salariais, especialistas estimam que o impacto anual da folha pode chegar facilmente à casa de milhões de reais, a depender da ocupação efetiva dos postos e da distribuição por faixa salarial. Sem um estudo oficial, porém, não é possível mensurar com precisão o peso da medida nas contas públicas.
A defesa prévia da manutenção dos cargos comissionados por Cleiton Lima, somada ao recente realinhamento político e à nomeação de familiares seus e de outros vereadores da base em cargos da Prefeitura — segundo fontes do É Notícias ligadas à gestão municipal — reforça a percepção de que o parlamento municipal tem atuado em sintonia com a estrutura política vigente.
Para lideranças consultadas, o discurso de Cleiton Lima ao justificar que “os cargos vão se manter” antecipa a lógica da nova lei: preservar espaços políticos, mesmo após decisão judicial que considerou a estrutura irregular.
Análises feitas por especialistas em direito público apontam que a Lei nº 810/2025, embora traga descrição formal das atribuições em seus artigos, mantém elementos que podem ser questionados: cargos genéricos, funções técnicas em comissão, sobreposições e ausência de critérios objetivos na definição de quantitativos. Para essas fontes, o desenho da estrutura pode novamente levar órgãos de fiscalização a contestar a legislação.
Enquanto a Prefeitura comemora a aprovação da nova estrutura, setores da sociedade civil questionam se a medida busca realmente organizar a gestão ou apenas preservar arranjos tradicionais de poder — agora reforçados pelo voto e discurso de vereadores que já antecipavam que “os cargos iriam se manter”.
O É Notícias seguirá acompanhando o caso e permanece aberto para manifestações dos vereadores, do presidente da Câmara e da Prefeitura.