O financiamento a empresas ligadas ao desmatamento tropical, tema central do estudo “Financiando o colapso da biodiversidade”, revela disparidades e pontos de convergência entre as ações globais e as práticas específicas no Brasil. Desde a aprovação do Acordo de Paris, em 2015, os maiores bancos do mundo destinaram mais de US$ 395 bilhões para setores econômicos associados ao desmatamento. Paralelamente, no Brasil, as três maiores instituições bancárias — Banco do Brasil, Bradesco e Itaú Unibanco — foram responsáveis por um volume expressivo de US$ 121,5 bilhões, com o Banco do Brasil liderando o ranking com US$ 95 bilhões.
Contribuição Brasileira no Cenário Global
Comparando o total global de US$ 395 bilhões com os aportes brasileiros, o Brasil representa quase 31% do financiamento mundial a setores com risco de desmatamento. Este dado é significativo, considerando que o país possui as maiores áreas de floresta tropical do mundo e uma economia fortemente dependente de commodities agrícolas. A liderança do Banco do Brasil, com US$ 95 bilhões — mais de 24% do total global —, reflete a relevância estratégica do país como centro de produção de soja e carne bovina, principais setores financiados pela instituição.
Dinâmicas Locais e Globais
Concentração Regional no Brasil:
Enquanto os bancos globais distribuem seus financiamentos entre empresas em regiões como América do Sul, Sudeste Asiático e África Central e Ocidental, o financiamento brasileiro é altamente concentrado na cadeia de produção interna de soja e carne bovina. Os US$ 47 bilhões destinados à soja e os US$ 45 bilhões à carne bovina mostram o papel central que estas commodities desempenham na economia e no impacto ambiental do Brasil.
Diversidade Setorial no Contexto Global:
Globalmente, os financiamentos estão mais amplamente distribuídos entre setores como óleo de palma, papel e celulose, borracha e madeira, além de soja e carne bovina. Essa diversificação sugere que o impacto ambiental do financiamento global é mais distribuído em diferentes ecossistemas tropicais, enquanto no Brasil ele está mais concentrado.
Escala de Impacto:
Os aportes brasileiros, apesar de representarem uma fatia expressiva do total global, são direcionados a um menor número de setores. Isso amplifica o impacto em ecossistemas específicos, como o Cerrado, altamente desmatado para a produção de soja, e a Amazônia, devastada pelo avanço da pecuária.
Compromisso com o Acordo de Paris:
O Acordo de Paris exige a redução de emissões de carbono e a preservação de ecossistemas. No entanto, os aportes financeiros observados, tanto globalmente quanto no Brasil, sugerem um descompasso entre as metas ambientais globais e as práticas econômicas. O Brasil, sendo signatário do Acordo e detentor da maior floresta tropical do mundo, enfrenta uma responsabilidade maior em equilibrar desenvolvimento econômico com preservação ambiental.
Reflexão sobre Responsabilidades e Soluções
Enquanto os números destacam a importância do Brasil no cenário global, também reforçam a necessidade de uma reavaliação das práticas financeiras. Os bancos brasileiros lideram o financiamento a setores que estão no centro do desmatamento, mas possuem a oportunidade de influenciar positivamente a transição para uma economia mais sustentável. Iniciativas que condicionem financiamentos à adoção de práticas agropecuárias sustentáveis podem reduzir o impacto ambiental, alinhando o Brasil às metas do Acordo de Paris.
Da mesma forma, em âmbito global, a pressão por maior transparência e adesão a critérios ESG (ambientais, sociais e de governança) nos financiamentos pode contribuir para mitigar os impactos ambientais das operações financeiras. A convergência de esforços globais e locais é essencial para enfrentar a crise do desmatamento e a perda de biodiversidade.