
Os editais lançados pela Secretaria Municipal de Cultura de Dias d’Ávila para aplicação de recursos da Política Nacional Aldir Blanc (PNAB) têm sido motivo de questionamento entre agentes e produtores culturais do município. As dúvidas surgem principalmente pela baixa concorrência — ambos os certames tiveram apenas um único habilitado — e pelas coincidências de vínculos religiosos e institucionais entre os contemplados e o secretário da pasta, Júlio da Silveira Reis Júnior (PSDB), conhecido como Júnior de Araci.

Antes da publicação dos editais atualmente em vigor, a Secretaria cancelou um edital anterior alegando a necessidade de “garantir a participação de candidatos ligados ao segmento gospel”. Entretanto, produtores culturais ouvidos afirmam que o documento cancelado não apresentava impedimentos à participação desse público. A medida passou a ser interpretada por parte da classe cultural como um ajuste capaz de influenciar o perfil dos contemplados. Além disso, uma das empresas beneficiadas nos editais seguintes foi aberta cerca de um mês antes da abertura das inscrições, o que intensificou os questionamentos.
No Edital nº 04/2025 – “Capacita Cultura”, com repasse previsto de R$ 27.280,63, o único habilitado foi Eric Carvalho, cantor gospel com 76,6 mil seguidores e coordenador de jovens da Igreja do Evangelho Quadrangular. O secretário de Cultura também é pastor e liderança na mesma denominação. Para agentes culturais, a combinação entre ausência de concorrência e vínculos institucionais indica possível favorecimento, embora não haja evidência formal de direcionamento.
Situação semelhante ocorre no Edital nº 05/2025 – “Influencer Digital Cultural”, estimado em R$ 27 mil, no qual o único habilitado foi Alcides Reis Santos Junior, conhecido como Pastor Junior Santos, influenciador gospel com mais de 400 mil seguidores. A reportagem identificou que a esposa do secretário, servidora da própria Secretaria de Cultura, aparece em conteúdos publicados pelo influenciador. O edital também exigiu como critério mínimo possuir pelo menos 300 mil seguidores, número que coincide diretamente com o perfil do selecionado — fator que pode ter restringido a competitividade entre demais comunicadores e artistas locais.

Além disso, os prazos de inscrição foram de apenas cinco dias úteis, com exigência de entrega presencial de documentos, conta bancária exclusiva e diversas certidões. Pesquisadores destacam que tais restrições tendem a limitar o acesso de artistas independentes e coletivos periféricos — públicos historicamente priorizados pela PNAB.
Especialistas em políticas culturais afirmam:
“Quando dois editais diferentes resultam em um único contemplado cada, ambos ligados ao mesmo grupo religioso e ao próprio gestor da pasta, o sinal de alerta é evidente. É preciso reavaliar os critérios e a condução do processo, porque política cultural deve garantir acesso amplo, não servir a um círculo restrito.”
A Secretaria Municipal de Cultura, Eric Carvalho e Alcides Reis Santos Junior foram procurados pela reportagem. Até o fechamento desta edição, não houve retorno. O espaço permanece aberto para esclarecimentos.